O que fica depois do incêndio, do “fedorão” e da fumaceira?

Desde a divulgação da causa do “fedorão” e da fumaceira da semana passada em Ijuí, as manifestações foram muitas e variadas, desde a indignação pelo ocorrido, como se aquilo não fosse esperado, já que toda a “bomba-relógio ativada, uma hora/dia há de explodir”, a culpa “da prefeitura” até a discussão do que deve ser considerado lixo e quem é o responsável por ele. Três palavras sempre voltam à minha mente quando vejo manifestações sobre esses assuntos das questões socioambientais, em especial quando estas tratam de questões próximas, daqui de pertinho, onde a influência de cada um dos cidadãos é muito clara.

A primeira palavra é a consciência de cada comentário, mostrando experiência e compreensão dos fatos, incluindo as causas destes acontecimentos, fazendo juízo do que é certo /errado em relação as melhores formas encaminhar os resíduos do município. Daí vem a segunda palavra, percepção que parece ser sinônima de consciência, mas dependendo da interpretação pode dar um sentido “a mais” que é o de “apreender por meio dos sentidos ou da mente” que pode ser interpretado como o “tomar para si ou incorporar” toda essa vivência.

Os comentários, ora se referem às responsabilidades individuais e coletivas e ora, como “eu faço”, assim ou assado, em geral considerando que a sua forma de fazer é a correta e que os outros são os errados….parece que são muitos, né?

Em Ijuí, a quantidade de resíduos coletada é de 45 a 65 toneladas por dia, variável ao longo da semana, dos quais, no máximo 5-6% são levados às associações de catadores e talvez sejam encaminhados para a reciclagem. Então vem a terceira palavra, a sensibilidade de perceber que é preciso mais do que consciência, que é necessário praticar a partir do conhecimento e da experiência, que é preciso reagir e fazer, cada um a sua parte, desde o início de todo este processo de gestão de resíduos. Geralmente se fala em “3Rs” do Reduzir-Reaproveitar-Reciclar, mas falta ainda o R da Responsabilidade, que é compartilhada entre os geradores (todos nós) e o poder público que tem a delegação de fazer a gestão dos resíduos de um município. Isso só é possível se o agir de cada um tiver a sensibilidade de se colocar no lugar do outro, como por exemplo, dos catadores que fazem a maior parte da separação do que é reciclável e do rejeito, pois além do percentual que chega às associações ser muito baixo (no máximo 6%), grande parte do que é levado a partir da coleta seletiva é misturado, sujo e lambuzado….ou seja, rejeito! Além disso, literalmente o recurso destinado à gestão dos resíduos é enterrado indo para o aterro licenciado em um município a 100 km de Ijui. O recurso que poderia ser usado de outra forma, para educação, saúde, melhoria do que podemos chamar de bens comuns, é utilizado para a coleta, transbordo, transporte e disposição final, tudo isso é parcialmente pago pela taxa que quase todos os munícipes pagam junto com o IPTU. São milhões de reais por ano, enterrados junto com algumas coisas que poderiam geram emprego e renda no próprio município.

Temos, desde 2007 a coleta seletiva dos resíduos recicláveis e gradativamente os serviços de coleta foram chegando a 100% do município, na cidade e no interior, mas ainda temos “N lixõezinhos” em todos os bairros, no centro, nas estradas e arroios. É vergonhosa essa falta de responsabilidade coletiva. Alguns dirão “eu faço o correto”, mas ainda falta uma parte que é a da fiscalização e da cobrança por esta ação que deve ser dos poderes públicos.

Que possamos literalmente apreender essa malcheirosa e poluída experiência e tomarmos a responsabilidade em nossas mãos para assim podermos cobrar do poder público a correta gestão e destinação dos resíduos e dos recursos públicos que são de todos nós.

Francesca Werner Ferreira

Bióloga Ambientalista